sábado, 7 de agosto de 2010

O momento derradeiro

Observavam calados. Fora tão breve sua existência, mas também tão bela. Mesmo nos momentos finais, mostrava-se pulsante. Olhavam serenos, num sentimento de respeito e de admiração. Era, de fato, lindo o espetáculo que se ensaiava em sua frente. E foi neste momento que um dos homens que descansava na beira-mar perguntou-se: “E se a onda, no momento em que estivesse quebrando tivesse consciência desse fato. Teria ela medo de tornar-se oceano?”. Ouvia-se apenas o barulho das ondas quebrando, e a brisa do mar refrescava e rejuvenescia a todos que a encontravam. O homem continuou: “A onda nunca deixara de ser oceano. Apenas nós a reconhecemos como algo individual, separável, que denominamos onda. Mas ela sempre fora oceano. Enquanto objeto individual, fora efêmera, bravia, mutável. Enquanto oceano, sempre o fora e sempre o será. As ondas são manifestações do todo que chamamos oceano. Elas nascem, crescem e morrem. Elas compõem o oceano e por ele são compostas. Elas afetam o oceano e por ele são afetadas. Existem enquanto designação nossa, mas nunca existiram sozinhas. Por que então temeriam elas voltar a ser oceano? Talvez porque a consciência de sua existência seja tão magnífica que as tenha cegado para o fato de que são parte de algo muito maior – que são compostas por algo que elas também compõem.”
E fora em uma das galáxias deste Universo, num pequeno planeta de um sistema solar qualquer, que manifestações da realidade, ondas no oceano, tomaram conta de sua própria existência. Elas faziam parte de um complexo e pulsante sistema chamado Universo. Faziam parte da história desse todo e também ajudavam a escrevê-la. Eram afetadas por ele e também o afetavam. E esses seres, organizaram-se em sociedades que eles próprios afetavam e pelas quais eram afetados. Participavam ativamente do rico e brilhante espetáculo da natureza. Mas essa consciência os cegou para a existência dessa teia de interações, de interdependência, de múltiplas relações de causa e efeito. Por isso, passaram a se enxergar como independente do resto, como seres isolados. E, logo, começaram a sentir medo daquilo que lhes seria sempre inevitável: a morte. Enquanto seres, indivíduos, eles morreriam, mas enquanto Universo eles sempre fariam parte do todo. Assim como as ondas deixam de ser ondas, mas nunca deixam de ser oceano. A onda pode se entender e se sentir onda, e talvez ela sempre se sinta mesmo depois de quebrar, mas ela não pode nunca perder de vista que também é oceano.
Ninguém pode dizer, ao certo, o que acontece quando morremos. Talvez continuemos nos entendendo como um ser, com nossa própria consciência e com nossos próprios desejos. Talvez não. No fundo, acredito que não importa. Deveríamos nos esforçar para nos vermos enquanto parte do oceano, enquanto partes desse maravilhoso e complexo sistema chamado Universo. Abramos os olhos para a interdependência que existe entre todas as coisas. E a morte? Não a temamos. Compreendemo-la como parte essencial da nossa própria história, e se conseguirmos, até brindemos a sua chegada. A morte, de certa forma, é o que nos faz vivos. As ondas não poderiam ficar imóveis, paradas, existindo para sempre. Elas precisam quebrar para que novas ondas surjam também.
E foi contemplando o mar, enquanto o Sol surgia no horizonte, que aqueles homens se regozijavam com a presença de todo o Universo.

8 comentários:

Lápis Sara disse...

Teu texto está ótimo. Muito bom mesmo. Parabéns!

Victória disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Victória disse...

Nathan!
O teu texto tá muito bom =D
*sem mas, uhasuh.

Unknown disse...

Adorei esse texto Nathan, muito bom ler e refletir depois. Parabéns!

Jéssica Lima disse...

Mano,
Que texto lindo!!!
Acho que é assim que acontece com todos...ficamos cegos diante dessa maravilhosa existência!Mas, quem sabe a eternidade não é mais maravilhosa ainda?
Beijos e parabéns pelo blog!Tá lindo!!

Unknown disse...

Ondas e oceano... Tá aí... Nunca tinha pensado nisso desse jeito. Excelente! Continue... E explique melhor, né?

Juliana disse...

Bem filosófico esse teu texto, confesso que me perdi no meio do caminho.
Uma vez a "sôra" Silvana mostrou um video muito legal que mostrava o qnt eramos insignificantes pro universo, ficou a ideia de fazer pelo menos a nossa vida valer a pena, a morte, quando morrermos descobrimos ^^
Ju.

Suzana Gutierrez disse...

Oi guri

Gostei muito! Só quem olha o Universo como algo que não está fora ou além de si mesmo pode escrever assim.

Assim como não vemos as coisas muito pequenas, podemos não ver as muito grandes também :) Sabe lá não somos só uma poeirinha de estrelas no bico do sapato de um gigante :)

beijão!