quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Na Casa de Cultura Mário Quintana

Foi depois de beber o segundo gole de café que percebeu já estar ali há um pouco mais de meia hora. Não esperava ninguém. Há muito tempo, já não esperava ninguém. Acostumara-se com a solidão. Havia virado uma grande apreciadora dos cafés, dos bons restaurantes, dos cinemas de Porto Alegre. Lia muito,frequentava os teatros e os concertos. Primeiramente, achou que estava apenas saboreando seu café; depois, percebeu que, há alguns minutos, não pensara em nada, nem reparara no gosto forte da bebida na sua boca. Olhou para o lado, viu uma moça bonita terminando seu lanche. Até então, não havia nem reparado na sua presença
Tomou mais um gole de seu café. Envelhecera sozinha. Acostumara-se com a amargura do café, com a amargura de sua própria vida. Quando moça, havia passeado por aquelas mesmas ruas, mas elas eram mais coloridas, tinham mais vida, da mesma forma que ela também tinha. Não conseguia determinar quando começou a ficar sozinha. Talvez tenha sido um processo tão paulatino que nem percebera. Quando viu, estava velha – velha e sozinha.
Já não tinha mais sonhos,nem paixões. Há muito tempo, esquecera-se do amor. Já evitava ler romances. Não se sentia uma mulher infeliz, era apenas um pouco só. Queria ter tido filhos, netos, tê-los visto crescer, se formar na faculdade. Queria ter feito doces para esperá-los nos fins de semana.
Sua vida não era ruim. Tinha um bom salário, morava num bom apartamento, podia viajar quando quisesse, embora não fizesse isso há alguns anos. Deixou-se estar na cadeira, por alguns instantes, vazia, oca. Depois, tomou o resto do café, já frio, de uma só vz. Pagou a conta e foi embora.